EMEF Irineu Marinho

Este projetoestá sendo desenvolvido em duas escolas municipais, na EMEF Irineu Marinho, em Vila Prudente e no CEU EMEF Presidente Campos Salles, em Heliópolis. Na 1ª, desenvolvemos um projeto de docência compartilhada de letramento sócio racial nas séries iniciais do Fundamental I, e na 2ª, no EJA, com o intuito de explorar os cânticos e responsórios da capoeira no processo de aprendizagem da leitura e escrita, envolvendo a leitura de mundo, como sustentado pelo educador Paulo Freire.

Embora este trabalho tenha se iniciado em 2021, a pesquisa de campo ganhou fôlego somente no ano de 2022, devido ao fechamento das escolas durante a pandemia. Pretendemos recorrer particularmente ao método Paulo Freire, de modo a estabelecer um diálogo com o que chamamos de Paidéia Afro-brasileira envolvida na transmissão dos ensinamentos da arte/luta da capoeira. Interessa-nos, em particular, a releitura da pedagogia do oprimido, teorizada por Paulo Freire, tal como propõe a autora Patrícia Hill Collins , uma vez que articula a educação crítica do educador brasileiro com o debate sobre a interseccional idade das opressões de gênero, raça e classe.

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A docência compartilhada da capoeira, conduzida por mim, Mestre Valdenor, em parceira com as profas. Valquiria Madu Viscaino (profa do Fund I) na EMEF Irineu Marinho e com a Ms. Profa. Ana Cláudia Florindo Fernandes e Prof. Paulo Vinicius Paiatto (prof de Artes do Fund.II da EJA), no CEU EMEF Presidente Campos Salles, pretende abordar a história desta arte/luta ancestral como parte das lutas de resistência da população negra de nosso país, desde a época colonial até a República, sempre explorando o sentido dos cânticos e dos próprios movimentos de defesa da capoeira. Como parte desta proposta, será promovido o ensino dos instrumentos musicais da orquestra da capoeira, como o berimbau, o atabaque e o pandeiro. A ideia é explorar a participação dos capoeiristas nas guerras e lutas abolicionistas, sempre ressaltando as barreiras para o reconhecimento desta prática ancestral, que, embora hoje admitida como patrimônio cultural, enfrentou a discriminação e o preconceito por vários séculos. Não se pode esquecer que sua prática foi considerada crime e incluída enquanto tal no Código Penal Brasileiro (Decreto nº 847, de 11 de Outubro de 1890), sendo revogada apenas em 1936, durante o governo de Getúlio Vargas.

Procurar-se-á demonstrar ainda que a capoeira é uma expressão de resistência das mais antigas de nossos afrodescendentes contra toda e qualquer forma de opressão e discriminação, cujas músicas e letras são uma forma de não esquecer a barbárie cometida em território brasileiro sob o regime escravocrata. Grande parte do êxito da capoeira nas lutas de resistência do escravizado é atribuído ao modo como a capoeira conseguiu disfarçar a luta em jogo e, desse modo, contribuiu para aglutinar os povos escravizados e fortalecê-los no interior do movimento abolicionista.

Como veremos, ao mesmo tempo que se ensina o canto e o jogo da capoeira  aos(as) jovens, é possível explorar a riqueza presente nas letras das músicas e se referir a algum episódio histórico importante da história de resistência do negro, como, por exemplo, na canção Marinheiro só, que se refere à grande concentração de capoeiristas na marinha brasileira, resultante do envio compulsório dos escravizados à linha de frente de guerras, como a Guerra do Paraguai,  no lugar dos filhos dos senhores fazendeiros escravocratas. Ou ainda, a música Meia Lua inteira, de  Caetano Veloso, em  homenagem ao Mestre Bimba, que criou uma didática e regras para o jogo da capoeira como estratégia para obter o reconhecimento da capoeira e sua descriminalização obtida no governo Vargas, em 1937.

Enfim, consideramos que as rodas de capoeira, com seus cânticos e responsórios, constituem-se em uma troca enriquecedora de informações sobre a história não contada de nossos afrodescendentes. Nossa intenção é justamente articular os cânticos e responsórios, suas histórias, as histórias do negro no Brasil com o que chamamos de letramento sócio racial dos estudantes, ou seja, propiciar a aprendizagem de leitura  e escrita, de maneira a desenvolver uma educação voltada para uma reflexão sobre as desigualdades e as opressões com vistas à promoção de uma justica social, ou seja desenovler formas de letramento associadas à aprendizagem da capoeira voltada para uma consciência crítica e para o empoderamento de nossos afro-descendentes.